Da importância de estar em contato com a bondade
Adoecemos quando mergulhamos em aspectos negativos do ser humano, da mesma forma que não conseguimos sobreviver submersos na lama.
Abri as inscrições para o meu workshop online, com o tema Autoedição: como editar seus próprios escritos. Para quem é apoiador do Puxadinho, tem um cupom de desconto de 20%. Vamos nos encontrar?
Posso afirmar sem exagero que Hayao Miyazaki é um diretor de animação japonês cuja palavra que melhor o define é: gênio.
Muito provavelmente você o conhece mais pela obra do que pelo nome. Se Princesa Mononoke, Viagem de Chihiro, Ponyo ou Meu Vizinho Totoro significam alguma coisa pra você, é graças a ele.
Eu gosto de me considerar uma pessoa criativa. Dedico algumas horas diariamente a trabalhar minhas criações. Escrever, tocar, desenhar e até fotografar. Em geral, quando encontro um bloqueio, entendo que talvez seja necessário quebrar minha linha de raciocínio viciada e tento fazer algo novo.
Foi assim que, por curiosidade e por estar em uma fase de atração pela obra do Hayao Miyazaki e do Studio Ghibli, que decidi assistir o documentário Never Ending Man.
Em síntese, o documentário pega o Miyazaki bem numa época na qual ele anunciou sua aposentadoria. Pouco tempo depois, ele decide, então, aproveitar o tempo livre pra se dedicar aos seus projetos pessoais. Um desses era um curta sobre uma lagarta, cuja ideia ele teve anos antes, mas nunca tirou do papel.
Assim, ele começa seus rascunhos e experimentações até perceber que não consegue passar de um certo trecho, sentindo as limitações da técnica que foi seu refúgio por toda a vida, a animação quadro a quadro feita à mão. Em um certo momento, ele se abre à possibilidade de trabalhar com CGI.
É bem interessante ver como ele se comporta durante a produção, o que chama sua atenção, o que o toca e como ele reage e se dedica ao que faz.
Mas aqui, gostaria de falar de um trecho no qual um grupo de animadores decide mostrar uma animação gerada completamente por inteligência artificial. A cena consistia em um corpo humano deformado que caminhava de maneira monstruosa, como se tivesse saído direto de uma cena de Resident Evil.
A reação do Miyazaki, nesse caso, me chamou uma especial atenção.
"Todas as manhãs eu costumava ver um amigo deficiente. Até mesmo um high five era difícil pra ele. A sua mão ficava estática e eu que tinha que levar a minha até tocar a dele. Eu penso nele e não consigo dizer que gosto disso [que vocês fizeram]. Quem quer que tenha feito isso não reflete sobre a dor. É muito desagradável. Você pode fazer coisas horríveis, se quiser, mas eu não quero ter nada a ver com isso. É um terrível insulto à vida."
Não é difícil compreender a fala.
Miyazaki viveu, ainda que como uma criança, o fim da Segunda Guerra Mundial. Sua mãe morreu de tuberculose após um longo período de 9 anos adoecida. Mas acho que, principalmente, por ser um xintoísta e ambientalista, a reverência que ele possui pela vida e por todas as coisas acaba transbordando todo o seu pensamento.
E é fácil observar. Sua obra é repleta de exemplos de respeito, amor e empatia. Os vizinhos se presenteam, velhinhos brincam com as crianças, as comunidades se ajudam. Mesmo os vilões, se olhar bem, eles raramente morrem ou têm um fim trágico. Miyazaki não resolve seus conflitos pela violência. Não é raro que esses mesmos vilões mudem, cresçam, se transformem e se tornem parte do time dos heróis (ou, no mínimo, manifestem ambivalência quanto aos seus interesses iniciais).
As crenças que permeam o pano de fundo moral da obra do Miyazaki são elevadíssimas, focando em aspectos positivos do ser humano, como quem quer deixar uma mensagem, uma semente.
E isso me traz aos nossos tempos.
Mais do que nunca, estamos soterrados por informação do pior tipo.
O tempo inteiro reforçam o que há de pior nas pessoas e constroem uma realidade na qual a guerra, a fome, o crime e a maldade pura são a regra. Quer dizer… eles são a regra, claro. Mas será que precisamos ficar alertas a todos os eventos terríveis do universo ao mesmo tempo? Na prática, ficamos apavorados, acreditando que devemos nos esconder atrás de muros e câmeras e que a única forma de transitar pelo mundo é enfurnado em uma lata com rodas, separados de qualquer toque da terra ou de outras pessoas.
Não me assusta que estejamos, enquanto sociedade, caindo doentes, depressivos e ansiosos.
Nós somos humanos, não fomos feitos pra ter contato ininterrupto com muita maldade. Adoecemos quando mergulhamos nisso da mesma forma que não conseguimos sobreviver submersos na lama.
Precisamos nos lembrar constantemente do nosso verdadeiro potencial ou somos arrastados pelo tsunami de notícias que reforça o lado perverso do ser humano. Nós não somos isso, ainda que possa parecer quando constantemente repetem essa mensagem.
É importante procurar por beleza, bondade, compaixão e amor. É essencial estarmos em contato com a natureza e reconhecer o equilíbrio, a harmonia expressa na energia que envolve e permeia cada grão de areia, cada folha de árvore, cada pequeno animal. Assim, conseguimos encontrar um tipo de cura que não está ao alcance de nenhum medicamento.
A dor e o sofrimento existem, claro, e não devemos esquecer deles. Porém, precisamos pensar em qual paisagem mental estamos construindo, dia após dia, minuto a minuto, por meio de tudo o que vemos e ouvimos, sob o risco de nos envenenarmos lentamente até esquecermos que também somos capazes de doar, de amar e de nos sacrificar por aquilo que é maior do que nós mesmos.
É importante também gerarmos beleza, espalhá-la pelo mundo para que seja uma expressão dessa grandeza que todos nós temos. Quando damos afeto, cuidamos de um jardim ou cozinhamos algo pra quem amamos, isso também é uma forma de colorir a realidade com tons vibrantes.
Quando falamos do que está na essência, o coração responde. Ele pede por mais, como se estivesse tentando se nutrir de algo que precisa para ser saudável.
Precisamos escrever e falar sobre o que as pessoas do nosso convívio estão fazendo para tornar o mundo melhor, inspirar, emanar outras frequências que não apenas o alarmismo barato pra gerar cliques e vender anúncios.
Do contrário, vamos nos esquecer da verdadeira natureza humana, que é ampla como o céu, infinitamente capaz de obras maravilhosas, feitas para nos conectar e aquecer.
Em tempos como os nossos, talvez precisemos mesmo disso. Mais harmonia, amor, equilíbrio. Que busquemos aquilo que ressoa, preenche e inspira.
Última turma do Autoedição: Como editar seus próprios escritos
Algumas pessoas pediram, então aqui está: abri uma turma do workshop Autoedição: Como Editar Seus Próprios Escritos.
Estou num processo de reformular todo meu projeto editorial, incluindo os cursos. Por isso, decidi que essa será a última edição desse workshop.
Essa turma é para quem ama a escrita ou tem o ofício no dia-a-dia para aprender como transformar seus textos em versões mais claras, impactantes e bem lapidadas.
Se você sempre quis entender como abordar a edição de forma prática e objetiva, essa é uma ótima chance para mergulhar no processo comigo. :)
Olha só, que legal esse depoimento sobre a última edição.
📅 Quando?
Terça-feira, 10 de dezembro, das 19h às 21h.
Quarta-feira, 11 de dezembro, das 19h às 21h.
💻 Como funciona?
Workshop online, ao vivo, em duas sessões de duas horas cada.
🎯 O que você vai aprender?
Estratégias para ganhar perspectiva sobre o seu texto.
Técnicas de macro-edição (estrutura, ritmo, intenção).
Dicas práticas de micro-edição (linguagem, clareza, transições).
As aulas ficam gravadas por 30 dias, e os participantes recebem um material exclusivo em PDF com checklist e referências.
👥 Quem pode participar?
Escritores de todos os níveis (não apenas profissionais da escrita) que desejam aprimorar seus textos, da primeira à última versão. Apoiadores do Puxadinho têm desconto especial de 20%.
📩 Dúvidas? Escreva para mim no e-mail luri@luri.me ou veja mais detalhes na página do Sympla.
Espero você lá!
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Então, você já sabe o caminho:
Esse texto foi um alento na minha leitura no metrô a caminho do trabalho. Coincidentemente passei por uma situação desagradável ontem onde senti a maldade encarnada na minha frente. Respirei e pensei que as coisas são muito maiores e melhores que aquilo. É muito louco porque às vezes eu sinto que a gente dá um peso muito maior para as coisas ruins do que para as coisas boas, saber driblar isso é uma arte, e acho que a reação do Miyazaki que você transcreveu, é a prova de que podemos, sim, chegar a esse grau de discernimento, maturidade e sensibilidade.
Achei esse texto muito importante e fiquei curioso com o documentário. Ver coisas bonitas e se aproximar do que é positivo em nossa humanidade faz toda a diferença. De vez em quando, lembro de pessoas próximas comentarem que evitemos palavras negativas, como "desgraça", "ódio", sob o risco de que isso, como você disse, envenene o nosso dia a dia. Acredito em energia e sinto que, citando você: "precisamos pensar em qual paisagem mental estamos construindo, dia após dia, minuto a minuto, por meio de tudo o que vemos e ouvimos", para construir uma vida mais saudável.