O último mês foi uma completa montanha russa.
De repente, me vi com a necessidade de empacotar minhas coisas e mudar para outro lugar, em outra cidade, com uma vibe completamente diferente.
É estranho você se ver tomado por uma situação que te faz perder completamente o poder sobre a sua rotina. Eu tinha todo um agendamento feito para o mês de junho de 2025. Roteiros para vídeos, uma ideia para um workshop e novos textos para minha newsletter. Mas, do nada, tive que virar em outra direção, priorizar a vida real.
O mais curioso nem é o fato de que eu tive que aprender um monte de coisas que fogem ao estereótipo do escritor contemplativo. Lixar, pintar, preparar uma parede com massa, mexer com parte elétrica ou fazer manutenção em pia, máquina de lavar e fogão. Faço aqui uma pausa para agradecer, novamente, aos criadores do Youtube, essa plataforma maravilhosa que salva os apaixonados por DIY, jovens universitários recém-saídos da casa dos pais ou adultos desesperados com as confusões da vida.
Como eu ia dizendo, o que realmente chamou minha atenção foi me pegar no meio de tudo isso, sentindo dentro de mim uma necessidade que, naquele momento, não tinha como eu atender. Eu não queria, sei lá, dormir na minha cama ou comer algo feito no meu fogão — ao menos, não naquele momento em específico. Eu senti saudade de criar. Aliás, mais do que uma saudade, eu tive uma ânsia, uma urgência. Algo forte. Algo que me remeteu diretamente à palavra vício.
Sim, era isso. Vício.
Talvez, seja um pouco forte demais chamar desse jeito, mas quando penso no que acontece comigo quando não estou criando, acho que realmente se aplica. Nessas fases, quando estou por algum motivo distante da rotina criativa, eu começo a minguar. Eu me torno uma pessoa bem amarga, mal humorada, difícil de lidar. Fico impaciente, temperamental.
Dependendo do nível de distanciamento, começo até a me afundar em atividades destrutivas. Consumo, excesso de telas, álcool, cigarro.
Tem algo de fundamental nessa experiência do fazer criativo, da arte. Pra mim, é o terreno onde eu piso. Sem isso, tudo balança e eu adoeço.
Por outro lado, quando começo um processo criativo, é como se fosse tomado por outra coisa. Sabe, essa emoção que está sempre ali, sussurando no ouvido que você não vai dar conta, que vai passar vergonha e fome? Ela some. O medo some. É incrível, totalmente diferente.
Isso me lembra uma fala do ray Bradbury que li um século atrás — e que, agora, vi que saiu no The Paris Review.
“Minha paixão me leva à máquina de escrever todos os dias da minha vida, e ela tem feito isso desde que eu tinha 12 anos. Então, nunca tive que me preocupar com cronogramas. Alguma coisa nova está sempre explodindo em mim, e é isso que me programa, eu não faço nada.”
Pra ser sincero, eu me preocupo com cronogramas. O único problema é que tenho uma dificuldade enorme em seguir o que determino. No final das contas, minhas criações tem um tempo próprio. O cronograma é mais pra dar uma ideia geral e pra eu não me perder numa coisa de adiar algo pra semana que vem e deixar passarem dois anos — acredite, eu faço isso.
Ainda assim, eu me identifico com a fala no aspecto de sentir algo que sempre me move em direção ao teclado, ao papel ou ao violão.
De uns anos pra cá, depois de eras sofrendo ao tentar executar projetos e mais projetos que nunca saiam do campo das ideias, eu adotei uma tática diferente. Ao invés de planejar cada etapa, eu me permito aproveitar o pico de energia do começo, progrido ao máximo o mais rápido possível, como um louco. E, depois que o interesse passa, aí sim, apelo mais pra disciplina e pra cumprir o cronograma.
Tem uma fala da Susan Sontag, também na The Paris Review, que ressoa com isso.
“Eu escrevo em jorros. Escrevo quando tenho que escrever, quando a pressão aumenta e sinto confiança suficiente que algo amadureceu em minha cabeça e eu tenho que escrever isto. Quando algo está realmente a caminho, eu não quero fazer mais nada. Eu não saio de casa, na maioria das vezes me esqueço de comer, eu durmo muito pouco. É uma forma de trabalho bem indisciplinada e não me faz muito prolífica. Mas eu estou muito interessada em várias outras coisas.”
Eu ando bem insatisfeito com o fato de que tem um tempo que não lanço nada mais artístico. Sim, eu escrevo aqui (quase) toda semana. Alguns textos eu considero arte, outros eu prefiro não comentar. Mas acho que me falta algo similar a um álbum, o retrato de um momento. Algo que dê para segurar e dizer “aqui, sou escritor e essa é a prova”.
Talvez seja por isso que a coceira da criação esteja batendo tão forte, mesmo em meio a uma crise muito mais urgente.
Meu sonho, quando criança, não era ser “produtor de conteúdo”. Eu queria ser artista, viver para fazer “minhas coisas”. Até hoje, é o que quero. No entanto, vou confessar… acho bem bizarro como isso bate em mim tão forte justamente nesse momento.
Chega a ser até estranho pensar que a necessidade de criar não negocia com as circunstâncias. Ela não pergunta se você tem tempo, se tem um lugar adequado, se suas contas estão em dia. Ela simplesmente bate na porta e diz 'é agora'. E, se você não atende, ela não vai embora. Ela fica ali, insistindo, fazendo você sentir febre e tremedeira se ignorar.
Então, sim, talvez seja mesmo um vício. Mas, se é pra ter algum, pelo menos esse não é tão destrutivo. Na verdade, pelo contrário, esse vício me reconstrói, me dá eixo e força. Ele me lembra quem eu sou, do que eu sou capaz, mesmo quando tudo se desfaz ao meu redor.
Nos momentos em que posso me dedicar a criar algo sincero, é quando percebo que posso fazer mais do que sobreviver ao mês. Eu posso, de fato, me sentir vivo.
E, agora, mesmo escrevendo rodeado de caixas e de tarefas pra resolver, eu sei que posso me sentir em casa de novo. Porque tanto faz se estou em São Paulo, Vitória ou Aracruz. Não é a cidade, o bairro ou as paredes ao meu redor que trazem paz. Tem um espaço confortável que independe da configuração externa. O que eu chamo de casa é algo que eu crio. Não é um lugar. É a sensação de estar fazendo exatamente o que eu quero fazer, alimentando o único vício que vale a pena ter.
O único vício bom que eu conheço.
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Pois é, voltei :)
Essa foi uma temporada bem maluca. Fiquei fora de operação por praticamente todo o mês de junho por causa da mudança que tive que fazer às pressas.
Forcei um pouco a barra pra fazer ao menos uma publicação, mas fora isso, não deu pra fazer mais nada. O resultado, como esperado, foi um apagão na minha escrita.
De qualquer forma, finalmente estou de volta. (YEY)
Então, agora, a ideia é retomar as publicações. Obrigado pela paciência, especialmente aos apoiadores que fizeram doações e que não cancelaram a assinatura. <3
Até semana que vem!
Entendo tanto esse texto. Brinco que meu termômetro de vida é a escrita. Quando estou escrevendo, está tudo bem. Quando não estou, suspeite: os pratinhos devem estar totalmente fora de equilíbrio. É nosso lar, nosso lugar quentinho 💙
"o que eu chamo de casa é algo que eu crio. Não é um lugar. É a sensação de estar fazendo exatamente o que eu quero fazer, alimentando o único vício que vale a pena ter"
Esse texto me tocou bastante!
Obrigada por compartilhar a sua experiência!