Costumo dizer que sempre que eu termino um projeto criativo, especialmente os musicais, me dá vontade de parar tudo.
Sim, eu que defendo aos quatro ventos sobre a importância de nos dedicarmos à vida criativa como uma maneira de realizarmos nossos potenciais humanos, afinal, também sou humano e me vejo questionando se faz mesmo sentido seguir dando murro em ponta de faca pra colocar no mundo projetos que, no final das contas, não pagam as contas.
Nessas horas, me vejo tentado a colocar mais do meu tempo e energia às formações para ser um melhor profissional e ter um caminho "fácil” — com muitas aspas — aberto à minha frente. Demanda até que tem.
Buscar esse encaixe não parece ser ruim. Você planta, você colhe. Tem lá uma baia e um salário esperando você.
Eu entendo quem faz isso e tem a sorte de conseguir se encaixar. Entendo ficar feliz com um carro, uma casa, escapadas periódicas e almoços em alguns restaurantes bonitos o suficiente pra atualizar o Instagram. Mas comigo não funciona.
Eu gosto de usufruir dos frutos do meu esforço. Óbvio. Viajar, provar novos sabores, ouvir novos sons. Isso me anima, com certeza. Mas pra mim é pouco.
Eu não consigo sentir que isso é felicidade. Dá alegria, um barato. Mas não chega nem perto de parecer com algo que eu definiria como felicidade. E eu estou falando também das grandes conquistas, das maiores e mais caras.
Sem exagero, conseguir algo desse tipo me alegra tanto quanto tomar uma garrafa de Red Bull. Em algumas horas, volta tudo ao que era antes e eu fico com mau hálito.
Em seguida, tenho que me confrontar com a realidade de que não me basta encontrar um lugar predefinido para ocupar. Pra piorar, também não consigo querer ser mais um consumidor caminhando como um fantasma faminto, sedento por mais, sem nem saber exatamente o que esse mais seria.
Então lembro que a única posição que me gera algum tipo de satisfação é quando crio. Há alguns dias um amigo me falou “eu sinto que você precisa fazer isso”. E é verdade.
Sem dar vazão a esse "isso”, eu vou murchando. É como se a polaridade dessa energia não encontrasse fruição e, após bater nas muralhas da represa, viesse com a polaridade invertida. Ao invés de criar, eu começo a destruir a mim mesmo e aos outros. Fico amargo, crítico, intolerante.
Mora aqui essa necessidade de expressão, de colocar pra fora em forma de beleza ou de caos organizado o que eu sinto. É uma maneira de fazer amizade com os demônios, mas também, de desinverter a polaridade da energia e voltar a um espaço de brincar, de curiosidade, de descoberta e vivacidade. É onde sinto que toco a vida e que a vida me toca.
Quando há espaço para contemplar e repousar, vem naturalmente a transmutação em forma, som e palavra. O pensamento vira fluxo e sai em texto, música, experiência.
Mas a cultura nos aprisiona com a mensagem de que ser quem somos não tem lugar. É preciso ser útil ao grande mecanismo, ocupar sua baia, comprar suas coisas.
Ainda assim, com o coração meio pessimista encontro o fôlego e tiro de mim, mais uma vez. Percebo que não existe outra coisa a ser feita a não ser continuar e continuar continuando.
Só isso, essa micro resistência contra a imposição soberana da porta pra fora, já é alguma coisa. Pelo menos, pra mim.
O coração diz que é importante continuar compartilhando, vivendo e criando coisas que não têm lugar.
Hoje, escrevi mais um texto.
Cesta de compartilhamentos
A Georgette Smith é uma artista com o que existe de mais raro: um jeito de fazer as coisas que é dela. Eu não sei exatamente o que é, mas essas imagens parecem saídas de um sonho, de uma lembrança antiga. Eu fico absolutamente encantado e queria mostrar aqui pra vocês.
Ouça Todo Mundo Vê ao vivo
Recentemente, lancei meu primeiro álbum, o Espaço Interior. Quem quiser ouvir, é só clicar aqui.
Como parte dos ritos de lançamento, venho soltando também vídeos com as músicas tocadas ao vivo no estúdio, com banda e tudo o que tem direito. Dessa vez, saiu Todo Mundo Vê, uma das músicas que mais gosto no disco.
A letra fala sobre como é impossível a gente esconder quem somos ou o que estamos sentindo. Não existe máscara que realmente esconda coisa alguma.
O trabalho foi feito com o apoio da Secult-ES e do Funcultura.
Minhas coisas
Gostou do que faço? Também estou aqui:
Instagram | Twitter | Youtube | Spotify
Passando o chapéu
Se você chegou até aqui, considere contribuir com meu trabalho enviando um PIX simbólico de qualquer valor (qualquer valor mesmo!) para: luri@luri.me.
Se preferir usar cartão ou Paypal, também pode me pagar um cafezinho no Ko-Fi.
O Ko-Fi tem a opção de fazer uma contribuição regular mensal. Essa seria a contribuição ideal, se você me permitir escolher. ;)
Agradeço de coração por todo o apoio!
Um abraço apertado,
Luri
Luri, esse tema é recorrente nas minhas reflexões. Também já escrevi sobre isso. Poder trilhar um caminho autoral é sempre um desafio. Deixei duas carreiras pra trás pra seguir meu projeto de uma vida simples, perto da natureza, mais tranquila e em paz. Ainda estou tentando equilibrar o possível e o real. É um processo que leva uma vida. Mas precisamos continuar continuando!
Tocou-me muito. Vou compartilhar no meu Instagram.