Mais uma notícia escabrosa: um anestesista estuprou uma mulher enquanto ela fazia uma cesariana. Descrever essa cena me deixa de estômago revirado. Sequer tocar a possibilidade de um fato desse existir é demais pra mim. E no entanto, ele existe.
Menos de duas semanas atrás, um homem negro foi sufocado até a morte em uma reedição brasileira da câmara de gás dos campos de concentração nazistas. Ainda ontem, um bolsonarista invadiu a festa de aniversário de um petista dando tiros em quem estava lá, matando o aniversariante. E estou sendo breve, pois essa lista poderia se estender rumo ao infinito se começássemos a listar as pessoas ativistas, negras, indígenas e mulheres assassinadas nos últimos anos.
É muito machismo, homofobia, racismo, especismo, capacitismo… são tantas variações de crueldade expressas de formas inimagináveis que é difícil demais não cair no extremo da misantropia e do niilismo nesses dias de Bolsonaro.
Hoje eu escrevo com os dedos pegando fogo e os olhos transbordando. Que mundo escroto da porra.
É certo que ele não inventou nenhuma dessas formas de ódio, mas não consigo deixar de sentir que os dias parecem muito piores sob a batuta dele, uma vez que ele não tem timidez nenhuma em soltar frases de efeito como “não sou coveiro" ou “e daí?", imitando pessoas doentes morrendo sufocadas pela covid e fazendo pouco de quem se importa com seus idosos, amigos e familiares morrendo.
Um dos efeitos de viver sob essa nuvem de atrocidades é como todos nós temos a régua da normalidade arrastada cada vez um pouco mais pra lá. Vamos nos deparando com tanta crueldade que perdemos o referencial. Vira o novo normal saber que essas coisas acontecem e, às vezes, até achamos que podemos deixar pra lá quando nos deparamos com algo menos ruim do que essas notícias de todos os dias.
Isso já é uma violência que não deveríamos aceitar.
Não, não estou dizendo que todos devem deixar de se informar sobre o que acontece no mundo e viver na terra encantada dos Hobbits. Também não estou dizendo que devemos deixar de lutar, intervir na política e de incomodar quem está confortável nos matando e destruindo o planeta pra enriquecer.
Só venho notando como também é importante lembrar de procurar outros referenciais e de equilibrar a dieta informacional com cultura que eleve, divirta e enriqueça. É essencial procurar arte, amor, compaixão e sexo, pois eles temem alguém que não compartilha do mesmo ódio.
Afinal, se o mundo for essa desgraça toda mesmo e não houver uma outra forma de manifestar a vida humana, então, não há motivos pra lutar.
É por isso que deixo aqui como um lembrete pra mim mesmo: não podemos esquecer que não é normal viver no inferno.