Um dos maiores clichês do blues são as canções que começam com “acordei essa manhã e… x coisa”.
Vou me dar a liberdade de começar esse texto desse exato jeito.
Acordei essa manhã, coloquei a água para esquentar, em seguida, passei manteiga no pão. Depois, voltei ao fogão, a água ainda não estava fervendo.
Foi o tempo de colocar algumas colheres de café no filtro e, então, pude notar as bolhas se agitando na água. Enquanto passava o café e sentia aquele cheirinho maravilhoso tomar conta da casa, me dei conta do quanto aquilo me deixava contente.
Café com leite e pão com manteiga. Só isso.
É impossível fazer as contas de quantos café-com-leite-e-pão-com-manteiga eu já comi. Essa deve ser a experiência mais repetida que tive nessa vida. E, no entanto, volta e meia me pego deslumbrado sobre como ainda consigo tirar satisfação desse aconchego. Mesmo sendo um fenômeno ridiculamente reprisado, ele ainda movimenta minha energia.
Quando saí do Pará e fui me aventurar por São Paulo, fiquei quase dois anos sem retornar a Belém. Eu queria essa distância, mas depois de um certo tempo, comecei a sentir falta de lá. Não do que era extraordinário e belo, mas das atividades mais comuns.
Tomar suco de taperebá, comer peixe, ouvir o sotaque, as gírias. Conversar com a mãe durante a novela, andar de bicicleta pra escola, jogar videogame com o irmão.
Passei a lembrar de outras alegrias que a correria, o estresse no trabalho ou mesmo a mera falta de atenção me fazem deixar pra lá.
Não resisti e fiz uma pequena lista de felicidades banais que hoje me fazem falta.
1. Jogar videogame com o meu irmão depois da escola.
2. Tempo livre pra fazer nada.
3. Tapioca com suco de acerola da minha avó.
4. Andar de bicicleta com os meus amigos da escola.
5. Tomar café de tarde com amigos.
6. Ensaio semanal com a banda.
7. Ir pra Estação das Docas, em Belém, e ficar de bobeira lá, pegando vento na cara no final da tarde.
8. Visitas inesperadas
9. Passar a tarde desenhando
10. Jogar RPG e criar histórias com os amigos
11. Ouvir um disco e conversar sobre ele com alguém, com foco total nisso
Algumas dessas coisas já não posso mais fazer, já que a infância ou a adolescência se vão há bons anos.
Mas ando pensando que vale abrir o espaço ou exercitar a presença para estar lá ao ponto de ver e realmente aproveitar as pequenas felicidades disponíveis agora. Ver um filme, ler, andar pela praia, ver exposições, curtir shows de artistas locais, ir a um bar com os amigos.
Afinal, assim como as felicidades banais da infância, da adolescência, da escola, do primeiro emprego… todas essas experiências são fugidias, impermanentes. Passam como um sopro e viram saudade ou, pior, ressentimento.
Melhor aproveitar agora, com atenção plena e disponibilidade do que olhar pra trás e pensar que desperdicei a oportunidade.
Na Vitrola do Luri: Maglore - V
Uma das bandas brasileiras que mais gosto. Maglore está num território sonoro que realmente me agrada. Nem vanguarda demais ao ponto de chocar e nem excessivamente no passado ao ponto de parecer uma cópia barata. Além disso, não dá pra negar que é um som ensolarado, que anima um dia triste e traz esperança pro futuro.
Recentemente lançaram disco novo, chamado apenas de "V". Vou deixar aqui como a recomendação da semana.
Em tempos tão conturbados, é um som que desce como um bom chá pra acalmar a ansiedade.
Diário de Produção: já é semana que vem!
O meu álbum, Espaço Interior, já sai na semana que vem!
Vou poupar vocês de um textão antes da hora, mas já deixo aqui o link de pré-save para quem quiser garantir as músicas na playlist do Spotify assim que o álbum estiver disponível. Então, é só clicar aqui e salvar pra ouvir.
Passando o chapéu
Se você chegou até aqui, considere contribuir com meu trabalho enviando um PIX simbólico de qualquer valor (qualquer valor mesmo!) para: luri@luri.me.
Se preferir, também pode me pagar um cafezinho no Ko-Fi.
O Ko-Fi tem a opção de fazer uma contribuição regular mensal, o que seria ainda mais ajuda. ;)
Um abraço apertado,
Luri
Texto delicioso (e fechar com Maglore é fechar com chave de ouro).
Moro fora há três anos e, planejando as férias de volta à terrinha, minha mãe e irmã sempre querem fazer essas coisas diferentes, alugar casa de praia e sei lá mais o quê. Mas a gente sente saudade é do café de todo dia mesmo, ne?
Que texto gostoso, obrigada ❤️ To aqui pensando nas minhas felicidades banais. Elas mudam tudo!