A estranha sensação de tentar tirar de dentro algo que você não tem
Quando a fonte seca.
Um dos estágios do sofrimento criativo é odiar seu próprio trabalho.
Não é só o desprezo de quem viu algo que não gostou. É ódio. É reconhecer-se responsável por algo ridículo, detestável, deplorável. Algo que vai levar meia dúzia de pessoas a uma perda de tempo irrecuperável.
Você percebe, então, que depois das pessoas enxergarem a sua criação, o olhar de decepção tende a se direcionar ao autor. Sim, você. O incapaz.
Talvez você seja tomado por uma vontade irrefreável de se aperfeiçoar, tornar-se o melhor no que você faz. Talvez, não. São grandes as chances de você enxergar uma muralha que cresce rumo ao infinito.
E, com essa visão, uma constatação: talvez você não tenha nem o talento e nem o estudo pra ser um artista, escritor, músico, poeta… Será que você é só… ruim?
Após muito martelar um trabalho, tive uma espécie de mini-burnout. Pânico. A famosa vontade de dar com a cabeça no teclado do computador.
Eu não conseguia encontrar essa “coisa” que eu estava tentando escrever e o que eu enxergava como a solução era algo que eu simplesmente não conseguia reproduzir.
Assim, minha mente foi cruzada por essa pergunta. Será que eu não tenho o que é preciso?
Podia ser verdade. Podia mesmo.
Era aterrorizante.
Não há como explicar a sensação de ter vontade real de desistir mesmo da pequena aspiração de ser bom em algo que gosta. Não pela decepção de não se ver atingindo o patamar de certos delírios de grandeza, fama, fortuna, mas por não se ver nem como minimamente capaz.
Você não tem o que precisa.
A frase se repetia.
E eu desisti.
Agora chega, eu não vou conseguir. É isso.
Fim.
Fui fuçar o Youtube e ouvir os caras que eu admiro. Assisti alguns shows, pra babar o talento que eu não tenho.
Minha cabeça não parava. Eles são bons, você não.
Talvez a sua ideia seja ruim. Deixa pra lá.
Até que começaram a vir as palavras. Corri pro computador, comecei a escrever. Encontrei o que eu estava procurando — ou, ao menos, o que dá pra fazer agora.
Eu, que sou avesso a isso, finalmente entendi o significado da palavra “serendipidade”.
O que fazer quando a inspiração não vem de jeito nenhum?
Ou quando você acha que não tem as habilidades?
Talvez, seja a hora de contar um pouco com o acaso.
Não completamente, na verdade. Você trabalhou, pesquisou, quebrou a cabeça até surtar, até chegar ao limite de desistir. Esse trabalho não se perde quando você para um pouco.
Mesmo sem acreditar que chegou a algum resultado expressivo, esse esforço abre um olhar. Você procura algo, criou alguma base. Caso encontre esse algo ou outro efeito interessante, você vai saber. Você está pronto pra ver.
De uma certa forma, esse poder do acaso começa com disciplina, estudo, paciência — e, nesse caso, a perda dela também.
Cesta de compartilhamentos: O Livro dos Insetos Humanos
Vou confessar: quis comprar esse mangá apenas pelo título.
Inicialmente, pensei que era um livro, depois olhei com mais atenção e vi que era um mangá de Osamu Tezuka. Para quem não sabe, ele é um desenhista (ou mangaká) tido como o pai do mangá moderno. Inspirado pela obra de Walt Disney, trouxe uma nova estética para os quadrinhos japoneses e adicionou uma linguagem narrativa com ritmo cinematográfico que expandiu os limites do que era possível até então na arte sequencial.
Tezuka criou muitas obras como Astroboy, Kimba: o leão branco e a Princesa e o Cavaleiro. Em geral, suas obras são mais voltadas ao público infantil, mas existem também obras de um período mais tardio da vida do autor que retratam a sociedade japonesa de uma forma mais madura, muito influenciado pelo surgimento e sucesso do gênero Gekiga (mangás adultos).
O Livro dos Insetos Humanos é uma dessas obras, que foi lançada entre 1970 e 1971. Tezuka faz uma sátira, comparando a sociedade humana com a dos insetos e coloca Toshiko Tomura, uma jovem ambiciosa, como figura central da trama. Ela se reinventa constantemente para assumir o protagonismo em diversas áreas, tornando-se uma estrela no teatro, uma designer internacionalmente reconhecida e uma escritora premiada. Com seus múltiplos talentos, Toshiko é considerada uma gênia, indo de uma área para outra com facilidade e sempre de maneira impressionante.
O Livro dos Insetos Humanos é um mangá que desafia os clichês da época e da sociedade japonesa, abordando temas como machismo, sexualidade, narcisismo, relações tóxicas, materialismo e a busca pelo sucesso a qualquer custo.
Fiquei bem impressionado com a narrativa, que me prendeu e constantemente me surpreendia com um evento mais louco que o outro. Inclusive, tem uma das melhores cenas de assassinato que já vi em quadrinhos. Recomendo. ;)
Na Vitrola do Luri: essa playlist de grooves Afro Cubanos
Eu já trouxe esse canal outras vezes aqui, mas é difícil não recomendar. Essa playlist de músicas afro cubanas é a coisa mais maravilhosa que ouvi em muito tempo. Ando viciado.
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Um abraço apertado,
Luri
Estou passando por um problema parecido, quero escrever, mas as palavras não chegam na cachola, é como se não tivesse conhecimento do que quero escrever. Chego a achar que não sirvo e ler seu texto me fez refletir no quanto nos esprememos para sair alguma coisa. Tipo tenho uns 3 pedaços de newsletter que quero escrever e não sai. Vou continuar tentando, é o único jeito que conheço. Um abraço.